Duas vezes por ano, funciona assim: eu chego e bato um papo com o Toyama, meu dentista e bom amigo. Sento na cadeira para me preparar para o atendimento, me ajeito confortavelmente e fico parada. Percebo minha respiração enquanto ele prepara os instrumentos e me atualiza da vida dele.
Internamente, me conscientizo de que não é necessário tensionar nenhum músculo. É simples: não há o que temer. Quase sempre é só mais uma consulta de rotina, não dói nem demora. Com atenção, solto as mãos que já estavam apertadas. Ao abrir a boca, estou com os braços relaxados e com as pernas suavemente repousadas na cadeira, que quase deita. Tudo certo. É só relaxar.
Não é preciso voltar para esse cenário muito mais tarde: se me observo alguns poucos segundos depois, percebo que já tensionei músculos aleatórios. Me pego de boca aberta e mãos cerradas, com as pernas travadas e os ombros presos. Como se a cadeira fosse levantar voo e eu dependesse das minhas garras para me manter em solo firme.
Não foi na cadeira do dentista que realmente entendi isso. Foi só agora, que estou em Florianópolis, fazendo uma formação em Yin Yoga que isso me ocorreu — e no meio de uma prática. É por isso que as palavras pouco adiantam num momento de tensão: “Calma, você está muito estressado!” Já viu alguém melhorar por conta desse toque?
O melhor jeito de ir ao dentista é com relaxamento. E de ir a um restaurante, a um velório, ao supermercado, ao trabalho, a uma festa e também o melhor jeito de entrar em férias. A experiência muda. Entramos e saímos melhor, tomamos decisões mais sábias, não agimos reativamente e não acumulamos tensões despercebidas no corpo. O melhor jeito de ir a qualquer lugar é se estivermos relaxados. Mas, então, por que é tão difícil?
Depois de dias fazendo exercícios e mais exercícios para soltar, relaxar, ceder, entregar meus músculos e meu tecido conjuntivo ao chão, com uma professora consistente e generosa como a Marina Boni, só ontem entendi o que fazer, finalmente! Percebi que, na prática do Yin Yoga, estava fingindo relaxar, exatamente como faço na cadeira do dentista. Percebi que porque tenho a intenção de relaxar, porque sei que não é preciso tensionar, penso que já soltei. Mas não! O corpo é reativo. O processo é muito mais profundo e precisa de tempo e paciência.
Depois da experiência de sentir o que é esse soltar, eu disse: “Marina, agora eu entendi!”. E ela me explicou que a imersão é importante nesse processo por isso: o entendimento do relaxar não se dá pela teoria. Também não se dá pelo esforço. É uma entrega constante. Um pouco desesperadora, afinal, é desprender-se do controle. Mas libertadora, porque é uma ilusão acreditar que havia ali algo, de fato, em que se agarrar.
Relaxar na prática de yoga é um bom treino para relaxar na cadeira do dentista. E para, então, poder flertar com algum relaxamento na hora da raiva, do ciúme, da tristeza, da alegria. Ser mais espaço e menos tensão. Para isso, não vai bastar ler ou entender. É preciso experimentar e voltar, casar o conhecimento com a prática, ter a orientação de um professor e experimentar pacientemente até que a ficha caia. Não é fácil, mas do breve flerte que tive com essa experiência, posso dizer que me parece uma delícia.
Depois disso, só penso em quantas fichas ainda não caíram, e que só estão esperando minha boa vontade de sair da teoria e enfim praticar. Se o melhor jeito de ir ao dentista é relaxado, esse é o único jeito de se praticar Yin Yoga! Sem relaxamento, a prática simplesmente não começa. E esse é um bom treino para quando formos levar nossos corpinhos para a vida real.
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Obrigada, Isabella. Pratiquei por tanto tempo esse entender cognitivo que existe uma dificuldade enorme de entender de outro jeito. A desconexão com o corpo é tamanha dentro de uma realidade cultural que nos diz: ele não se encaixa, odeie-o. Não mes.espanta, a gente só olhar para ele quando algo vai meio mal. Praticando olhar para ele por aqui de um jeito menos discursivo (agora, na fila para tomar a vacina da gripe rs). Relaxemos, Ale
Alê! Sinto o mesmo aqui. É um caminho longo, né? Obrigada pelo comentário e pelo apoio sempre…
Que texto massa! Obrigado pela partilha. Me ajudou a ter uma ideia da diferença entre pensar que está relaxado/a e relaxar realmente.
Obrigada, José. Eu sempre penso nisso na cadeira do dentista, na fila dos Correios… São momentos em que a gente acha que está relaxado, mas na verdade lá estamos nós apertando algum músculo!