Cadê as emoções masculinas?

Cadê as emoções masculinas?

Em setembro de 2020, Nathália conversou com Guilherme Valadares sobre o mundo emocional masculino: cadê os homens nas conversas sobre as emoções?

Guilherme é fundador do Papo de Homem, professor do CEB e presença quase sempre confirmada nas melhores rodas sobre equidade de gênero no Brasil. Transcrevemos aqui um pedacinho dessa fala, que vale ser vista na íntegra.

Onde estão os homens?, por Guilherme Valadares

Esse é um tema que a gente tem olhado há bastante tempo, eu acho que se conecta com várias coisas. Então, comentando o que você falou sobre a fama dos homens serem mais raivosos, acho que tem um fundo de verdade bem concreto nessa fama. De uma certa maneira, grande parte dos homens são ensinados a suprimir as emoções. Mas a raiva é a emoção mais validada — ela é tida como uma emoção mais masculina, que faz parte de uma série de códigos de como um homem pode se expressar no mundo.

Eu vejo nos homens tanto uma expressão grande de raiva quanto um silêncio tremendo. E esse silêncio muitas vezes não é consciente, é um silêncio emocional involuntário.

Tem uma condição chamada alexitimia, que é a dificuldade de colocar emoções e sentimentos em palavras. Isso é tão comum entre os homens que existe um termo, alexitimia normativa masculina, que em resumo significa ‘eles não falam’, eles não estão falando!

Isso é muito interessante! A Associação Norte-Americana de Psicologia estima que 80% dos homens nos Estados Unidos lidam com isso em alguma medida. É quase como se fosse assim: ‘Estou tão acostumado a não olhar para minhas emoções que eu mal sei identificar o que estou sentindo. E menos ainda sei traduzir, de um jeito construtivo, específico e amoroso aquilo que se passa aqui dentro.’ Noto que isso é uma fonte de angústia muito grande para vários homens e também mulheres.

Assista à conversa inteira no nosso canal do YouTube

Fizemos uma pesquisa com mais de vinte mil pessoas em 2016 e vimos que 5 em cada 10 homens afirmaram que gostariam de se expressar de modo menos duro ou agressivo, mas não sabem como, não sabem nem por onde começar. 

Então, qual é esse começo? Quando eu fico pensando em por onde os homens podem entrar nesses diálogos emocionais, eu acho que tem uma camada anterior a começar a falar sobre emoções, que é questionar o que eu acho que é ser um homem. Isso naturalmente vai passar por um atravessamento do machismo. 

Entendo o machismo como um sistema cultural que coloca o masculino como superior ao feminino. Dentro dessa visão de mundo, desse sistema cultural, tudo aquilo que é visto como feminino é visto como pior. E as mulheres estão a todo momento tratando das emoções, expressando a sensibilidade e se colocando dessa maneira no mundo. Então para muitos homens começa a surgir uma coisa desde pequeno (vindo de fora, vindo de dentro, observando a mídia e a comunicação) que é: ‘Quem fala das emoções são as mulheres, quem fala do que sente são as mulheres, quem pede ajuda com frequência são as mulheres. Não eu!’

Isso vai virando uma camada protetora assim tão funda, uma armadura tão densa que, no meu entendimento, tratar das emoções masculinas, passa por esse aspecto em alguma medida.”

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