Tomar 8 copos de água por dia, fazer exercício físico, dormir bem… Tem coisas sobre nosso bem-estar que já sabemos de cor e salteado. Lemos muito por aí em revistas que falam sobre amenidades e talvez até já tenhamos conversado sobre isso em um consultório médico.
Na hora de uma gripe, de uma urticária, de um mal-estar no estômago são esses os primeiros pontos que checamos: estou me alimentando bem? Dormi o suficiente? Estou com hábitos saudáveis?
Mas e quando estamos no meio de um processo emocional? Quando a raiva nos deixa com os nervos à flor da pele, quando o medo quer decidir o que fazer ou a inveja corrói por dentro? No momento em que estamos tomados por uma emoção não costumamos ter em mente alguns lembretes que nos auxiliem a entender o que se passa. Tenho responsabilidade nisso? Existe outro jeito de lidar? De onde surge isso que sinto?
Aquela frase pouco simpática “Quebrou, pagou” comum nos estabelecimentos cansados de clientes desastrados poderia muito bem ser aplicada ao jeito com o qual lidamos com o que sentimos. Se quebrar, vai doer e quem vai pagar somos nós mesmos.
Este é o primeiro texto da série “3 lembretes para seu próximo episódio emocional”. Vamos passar por alguns pontos que podem nos ajudar a entender melhor o que sentimos — e que talvez não estejam tão claros assim. Neste texto, vamos tratar do primeiro lembrete, super importante.
A responsabilidade é toda sua
Essa frase parece óbvia, quase uma bronca de mãe de adolescente. Mas é exatamente isso que eu preciso lembrar toda vez que alguma coisa não acontece como eu quero.
Quando a irritação me toma porque meu marido está atrasado de novo, eu preciso respirar e lembrar que a irritação é minha. Não é patético? Essa emoção, cheia de ares de raiva, parece muito ser associada a ele!
Meu marido costuma se atrasar, sim, e isso é péssimo. Mas, se eu sinto raiva, a primeira coisa que eu deveria lembrar, antes de me voltar contra ele, é que essa raiva está aqui dentro. É toda minha. E se eu não cuidar dela, ninguém mais vai.
Um mesmo evento causa emoções diferentes em pessoas diferentes. Alguém poderia se sentir humilhado, acreditando que um atraso é um baita descaso. Uma outra pessoa mais atrasada ainda poderia se sentir aliviada — ufa! Talvez num começo de namoro, alguém achasse graça e visse nisso um charme.
Em mim o que acontece é irritação mesmo. Eu posso pedir encarecidamente, posso ameaçar, posso ir até o cartório e protocolar um documento que obrigue o senhor Gustavo a nunca mais se atrasar. Será que adianta?
Em um trecho do livro Apaixonado pelo mundo, Mingyur Rinpoche diz assim:
“As pessoas em toda parte se esforçam tanto para tornar o mundo melhor. Suas intenções são admiráveis, porém buscam mudar todas as coisas, menos a si mesmas. Transformar-se em uma pessoa melhor é tornar o mundo um lugar melhor.”
A vida é bem imprevisível e tentar consertar o mundo ao redor é bacana, mas talvez para isso tenhamos recursos limitados. Conserto o atraso, depois o desdém, e então trânsito, a falta de educação do mundo…? Parece que bem mais garantido é começarmos por nós mesmos.
Veja bem: eu mesma vou continuar tentando fazer do Gustavo um ser mais pontual. Mas, ainda assim, tenho tentado me comprometer a olhar para essa irritação que brota com mais curiosidade. Sei que enquanto estou tomada pela emoção, minhas palavras podem sair tortas. Posso ser rude e me atrapalhar. Posso não ser clara o suficiente. Tomar a responsabilidade da emoção para si é uma tarefa boa e árdua. Como ser clara e direta, mas sem agir a partir da emoção?
Talvez o Gustavo nunca mais se atrase. Talvez eu comece a me irritar com a música alta do vizinho, com a buzina chata do estacionamento do lado, com o tédio do meu domingo à tarde… As emoções vão aparecer de novo e de novo — é impossível controlá-las.
Lembro da arte japonesa Kintsugi, de reparar cerâmicas quebradas. Uma metáfora bonita de um cuidado com o que está ao meu redor. Uma louça em pedaços é lixo em tantos lugares! Facilmente poderia ser descartada. Mas aqui, não. Arregaçam-se as mangas. Olhamos para o estrago. E fazemos do conserto uma jornada.
Assim como a cerâmica quebrada, podemos aceitar a emoção que chega. Assim como a beleza imperfeita dos reparos, podemos fazer o voto diário de nos responsabilizarmos pelo que sentimos.
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No podcast das emoções, conversamos sobre o que sentimos de um jeito divertido e em primeira pessoa, usando para isso músicas incríveis. Ciúme, raiva, ansiedade, medo, inveja, saudade, alegria, culpa e muito mais! Ouça no Spotify ou com um clique no seu navegador!